Alguns escritores transfiguram a realidade para atingir o sonho; Vera Albers faz o contrário: transfigura os sonhos para atingir a realidade, sonhos esses que, por isso mesmo, brotando em solo estranho, conservam suas sementes de verdade insólita e, por vezes, chocante.

Ora é o desgosto de não ter um filho que a leva a uma creche, entre cavalos (A viagem), ora é a procura desse “essencial” que sempre foge ou se transforma: seja a ternura do marido (O essencial), o carinho do amigo (Meir), o que era e já não é (Tomates rosados), o mistério que se desfaz (Espelhos), e assim vai.

A linguagem livre, muito colorida e pessoal (às vezes cômica, às vezes inventada) vai apresentando tipos, lugares, situações variadas (reais ou imaginárias, mas sempre autênticas) que vão criando um mundo muito vivo nessa série de contos breves, ora lúdicos, ora desencantados, que parecem constituir o romance de uma vida, costurados pelo fio vermelho desse desejo complexo, nunca satisfeito, que luta contra a culpa, o conformismo , a convenção, a brutalidade, as esperanças vencidas, as...

A solução que ela acha é essa mesma: transpassar essa indevassável e cruel realidade com o gume do devaneio, a seta da alucinação, o respiro do absurdo que permite dizer coisas não dizíveis, como a despedida da filha à mãe que vai para um asilo: ”Ainda haverá um dia de sol na cadeira de balanço e a bem-aventurança do alienado que vive fora de nossa contingência”.